Por João Pedro Santos Costa e Gabriela Magalhães
As questões de gênero, sexualidade e masculinidades vem sendo discutidas constantemente na sociedade, seja assuntos ligados à identidade social relacionada ao sexo do indivíduo ou ao respeito a um conjunto de comportamentos sobre necessidades e desejos sexuais.
Com o objetivo de conhecer como se configura o exercício da sexualidade por parte de sujeitos privados de liberdade, a pesquisa “Gênero, sexualidades e masculinidades em instituições socioeducativas”, busca sistematizar e analisar as políticas públicas que proporcionem a reflexão sobre gênero e sexualidades com adolescentes em cumprimento socioeducativo.
A pesquisa está sendo desenvolvida em duas unidades de internação masculina, uma em Novo DEGASE, Rio de Janeiro e outra no Maranhão (CSRT/FUNAC), e é coordenada por Jónata Ferreira de Moura, professor do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Maranhão, Campus de Imperatriz, Doutorando e Mestre em Educação pelo Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade São Francisco.
No decorrer da entrevista, o professor Jónata Ferreira de Moura nos explica todos os detalhes do projeto da pesquisa como também os resultados obtidos até aqui. Quer mais detalhes? Confira na entrevista.
O porquê da pesquisa ser realizada com adolescentes em cumprimento socioeducativo?
Jónata Ferreira de Moura – Porque eles vivem em reclusão. Passam até três anos em reclusão e nós queremos saber quais as políticas públicas que tratam sobre gênero e sexualidade nos lugares em reclusão. Até porque podem existir menores infratores masculinos que têm o gênero feminino ou que se vê como homossexuais ou como bissexuais. A gente quer saber como os socioeducadores trabalham a temática e conseguem discutir isso com os adolescentes.
Qual foi o ponto de partida para criação do projeto?
Jónata Ferreira de Moura – O pontapé inicial foi para entender melhor como surge e como que as políticas públicas são elaboradas sobre a temática gênero e sexualidade nos lugares socioeducativos, e também porque é uma pesquisa quase que inédita, pois no Brasil quase não há pesquisas sobre esta temática nesses lugares de guarda de menores infratores.
Existe algum motivo pelo qual levou você a pesquisar sobre esse tema?
Jónata Ferreira de Moura – O motivo principal que me levou a pesquisa sobre o tema são minhas pesquisas anteriores. Na minha graduação já havia um interesse pessoal e acadêmico sobre a temática gênero e sexualidade. Atualmente essa temática é pouco ou quase nada discutida nesses lugares de internações de adolescentes e jovens. Parece que eles vivem em um lugar fora da sociedade, fora do mundo que a sua sexualidade não é discutida. Por isso a ideia de buscar entender o que esses lugares socioeducativos sabem sobre a temática gênero, sexualidade e como é discutida.
Qual a relevância da pesquisa para o ambiente acadêmico e fora da universidade?
Jónata Ferreira de Moura – A principal relevância fora da universidade é entender como que as políticas públicas são concretizadas nesses lugares socioeducativos, até mesmo para saber qual é a formação que os socioeducadores têm e como tratam da temática, e depois promover, indicar, instruir projetos de extensão para melhorar a formação dos socioeducadores, caso seja preciso. Então dependendo do resultado da pesquisa nós iremos promover e propor oficinas de formação para os socioeducadores tratarem da temática com os adolescentes em reclusão.
Como funciona o processo metodológico da pesquisa?
Jónata Ferreira de Moura – A metodologia é bem simples. Primeiro é um trabalho que tem como foco as discussões sobre identidade de gênero e identidade sexual. O trato em si é com entrevistas semi-estruturadas, depois as entrevistas serão analisadas a partir da análise do conteúdo de Bardan para encontrar categorias que brotarão das entrevistas e essas categorias nos darão possibilidades de trazer informações ou trazer afirmações sobre a temática nos lugares chamados socioeducativos. A pesquisa vai durar um ano e acontecerá apenas no ambiente onde os adolescentes passam até três anos em reclusão, com menores infratores do sexo masculino. Os sujeitos participantes da pesquisa são socioeducadores/as das áreas da segurança, psicossocial e pedagógica.
Além do curso de pedagogia, o projeto abrande outras áreas?
Jónata Ferreira de Moura – O projeto só abrange a área do curso de pedagogia. Está limitado, pois é uma parceria entre a Universidade Federal do Maranhão – Curso de Pedagogia e a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – Curso de Pedagogia.
Quais os principais resultados obtidos do projeto até o momento?
Jónata Ferreira de Moura – Como o projeto ainda está em andamento, temos alguns resultados bem iniciais, como algumas conversas indiretas que indicam que não existe ação do poder público para a formação e o assessoramento dos agentes socioeducativos, para trabalharem a temática gênero e sexualidade com os adolescentes. Então, existem algumas hipóteses, contudo estou esperando alguns dados mais concretos para realmente entender melhor e saber se essas hipóteses se comprovam.
Qual a reflexão que o trabalho poderá trazer?
Jónata Ferreira de Moura – Este trabalho buscará refletir sobre as condições construídas que podem estabelecer e manter práticas sexistas e homo/transfóbicas em ambientes onde a proposta pedagógica deveria agenciar uma educação social que aquilatasse os princípios básicos dos Direitos Humanos, conforme as normativas legais estabelecidas.
Sobre os desafios como pesquisador, quais foram os principais? Levando em consideração burocracia, infraestrutura, recurso financeiro e humano.
Jónata Ferreira de Moura – Sobre os desafios que eu tenho enfrentado, é o retorno das entrevistas, porque é muito complexo você conseguir o acesso ao lugar e conseguir conversar com os socioeducadores, por causa de uma burocracia judicial. Mas são questões que são protocoladas, que a gente tem de respeitar, pois fazem parte da instituição. Essas questões podem atrasar um pouco a pesquisa, mas já foram pensadas durante o projeto e elas fazem parte também do desenvolvimento da pesquisa. Sobre os recursos financeiros, posso dizer que esta pesquisa não consta com auxilio financeiro e temos pouquíssimos recursos humanos.
Você tem alguma coisa que gostaria de acrescentar?
Jónata Ferreira de Moura – Posso dize que, pesquisas dessa natureza são importantíssimas, principalmente nesses novos momentos de intolerância, desrespeito, descompromisso das pessoas, de ira que a sociedade brasileira vem passando. Penso que é fundamental discutir e falar sobre isso, principalmente para desconstruir uma ideia erronia, uma ideia furada sobre ideologia de gênero. Essa falácia chamada de ideologia de gênero é construída pelos extremistas religiosos, que não aceitam a diferença, que não respeitam as outras pessoas que também querem viver nesse mundo. Esses extremistas querem impor uma ideia sobre ser mulher e ser homem, como se isso fosse natural. Pesquisas da natureza como eu venho desenvolvendo, tentam desconstruir a naturalidade do que é ser mulher e do que é ser homem e mostrar que o gênero é uma construção social e que tudo está relacionado com nossas identidades e não com a ideologia.